Novo filme de Walter Salles, ‘Ainda Estou Aqui’, estreia com aclamação em Veneza

O filme "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles, destaca-se no Festival de Veneza pela atuação de Fernanda Torres como Eunice Paiva, que busca a verdade sobre o desaparecimento de seu marido durante a ditadura militar no Brasil. Baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva, o filme promete gerar discussões e representar o Brasil no Oscar 2024.

O mais recente filme de Walter Salles, Ainda Estou Aqui, estreou mundialmente no Festival de Veneza e já desponta como um dos grandes destaques do evento. A produção, que concorre na competição oficial, chamou atenção não só pelo enredo forte e tocante, mas pela atuação impecável de Fernanda Torres no papel de Eunice Paiva. A performance de Torres colocou seu nome entre as favoritas ao prêmio de melhor atriz. O filme segue agora para Toronto, onde terá sua estreia norte-americana, antes de ser exibido no Festival de San Sebastián.

A trama acompanha a vida de Eunice Paiva, uma mulher que viveu o trágico desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva, durante os primeiros anos do regime militar que governou o Brasil entre 1964 e 1985. Rubens, ex-deputado federal e engenheiro civil, foi um ativo participante da política antes do golpe de 1964, que o obrigou a exilar-se. Ao retornar ao Brasil para reencontrar sua família, foi sequestrado de sua casa em 1971 por forças militares e nunca mais foi visto.

Determinada a descobrir o que realmente aconteceu ao marido, Eunice travou uma luta incansável, tudo isso enquanto criava seus cinco filhos sozinha. Sua busca pela verdade transformou-a em um símbolo de resistência e coragem, e sua história de vida se tornou uma referência na luta contra as injustiças da ditadura.

A obra cinematográfica é baseada no livro Ainda Estou Aqui, escrito em 2015 por Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice, que revisita o caminho trilhado pela mãe e relembra as difíceis experiências vividas por ele e seus irmãos. O filme traz ainda um toque pessoal para Walter Salles, que tinha uma conexão próxima com a família, sendo amigo de infância de Nalu, uma das filhas de Eunice.

No elenco, além de Fernanda Torres, que já havia trabalhado com Salles em filmes como Terra Estrangeira e O Primeiro Dia, temos a participação de Fernanda Montenegro, ícone do cinema e do teatro brasileiros. Montenegro interpreta Eunice em seus últimos anos de vida, e a dinâmica entre mãe e filha no set trouxe ainda mais profundidade à personagem. Selton Mello também integra o elenco, no papel de Rubens Paiva.

Em uma entrevista após a estreia em Veneza, Salles compartilhou detalhes sobre a origem do projeto e sua relação pessoal com a história. “O livro de Marcelo foi um ponto de partida, mas as memórias que tenho de frequentar a casa da família Paiva também influenciaram muito. Era um lugar repleto de vida, criatividade e resistência, e queria que isso fosse captado no filme, especialmente nos primeiros momentos da narrativa”, explicou.

Salles descreveu ainda o desafio de retratar o impacto da repressão militar, especialmente após a invasão da casa de Eunice. “Tive que imaginar como aquele espaço, antes cheio de energia, se transformou após a violência. O silêncio, a escuridão… foi um contraste enorme com o que eu lembrava”. Eunice Paiva, segundo Salles, é o coração da história. “Ela nunca se deixou abater ou ser vítima. Lutou de forma silenciosa e estratégica contra o regime que destruiu sua família. Sua resiliência, sua capacidade de manter a dignidade, mesmo nas situações mais difíceis, são o que mais me impressionam. Era uma mulher que sorria nas fotos públicas, mesmo sabendo a dor que carregava.”

O filme, com lançamento nos cinemas brasileiros previsto para novembro, deve gerar discussões acaloradas, especialmente por tocar em um tema tão sensível na história recente do Brasil. A expectativa é que a obra represente o país na categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2024 e quem sabe Fernanda Torres na categoria de Melhor Atriz.

Com uma combinação de memória pessoal, história política e uma interpretação poderosa de Fernanda Torres, Ainda Estou Aqui promete deixar uma marca não só nos festivais internacionais, mas também no público brasileiro ao revisitar um capítulo doloroso e ainda relevante do país.